A Pajelança

A Pajelança

A pajelança cabocla da Ilha do Marajó é um culto herdado dos índios que habitaram aquela região. Os mistérios desse culto são passados oralmente de um pajé para outro. Somente um pajé pode identificar o dom do Pajeísmo em outra pessoa, mediante sinais enviados pela própria natureza, os Encantados ou Caruanas.


O Pajeísmo, segundo Zeneida, é o encontro do homem com as energias da Natureza, os Encantados ou Caruanas. O Pajé nada mais é que um instrumento para a manifestação dos Caruanas, energias viventes sob as águas. É ele que propicia a vinda dos Encantados em Terra para auxiliar os viventes em suas doenças ou dificuldades.

A iniciação de Zeneida no Pajeísmo se deu pelo Pajé Mestre Mundico do Maruacá, região do município de Salvaterra, na Ilha de Marajó, e durou  um ano e 17 dias para que todos os rituais e preceitos antigos fossem cumpridos. Ela aprendeu sobre o Mundo Encantado e seus mistérios, como as Sete Cidades Encantadas que existe sob o mar e onde vivem os Caruanas. Disse-lhe Mestre Mundico que tais cidades são formadas por elementos mágicos que só os Pajés podem conhecer. Explicou que Zeneida seria conduzida para esse mundo pelo Peixe de Sete Asas Coloridas.

Terminada a preparação para tornar-se pajé e para que pudesse cumprir a missão, iniciou-se a luta diária de Zeneida contra a discriminação e em favor da preservação do culto. Apesar de exercer seu dom e cumprir sua missão, ela nunca buscou seguidores para seu culto. Fazer proselitismo não é o objetivo da Pajelança Cabocla.

Zeneida foi apontada como a última Pajé Cabocla do Marajó. Não que não existam mais Pajés. Entretanto, hoje, o culto na Ilha passa por um processo gradual de assimilação de outras práticas e crenças, o que vem gerando mudanças nos tradicionais ensinamentos do Pajeísmo.

Os Pajés não podem, por exemplo, cobrar qualquer tipo de pagamento pelo auxílio aos viventes, conforme aprendeu Zeneida de seus mestres. Não há como pedir dinheiro para curar um doente, diz, pois tudo que o Pajé necessita para cumprir sua missão lhe é dado pela natureza. Não há como se pagar pelo ar, pela terra, pelas florestas e pelos animais. De igual modo, também não se paga pelo fato de ver-se curado.


Os Caruanas

Os Caruanas ou Encantados são as energias viventes nas águas. Estes Entes Encantados possuem missões que só podem ser cumpridas através de um Pajé. O básico das missões de um Caruana é, em determinado tempo, preservar o equilíbrio natural, mas em sua grande maioria dedicam-se à cura do vivente da Terra. Eles vêm em auxílio dos humanos que sofrem e lhes trazem alento às dores e a cura para seus males. O Pajé possui também uma missão que é a de ser a ponte, o elo de ligação com o Mundo dos Encantados. É através do Pajé no ritual da Pajelança que os Caruanas conhecem as necessidades dos viventes. É através dele que os Encantados produzem curas no corpo físico, equilibram os desvios da mente e cuidam do nosso interior, nosso princípio de vida, o espírito.
Finalmente, após cumprir as tarefas impostas pela Natureza, os Caruanas descem por uma Escadinha de Coral encantada, onde gradativamente são submetidos a uma transformação decrescente. Quanto mais desenvolvido o Caruana, mais ele percorre o caminho inverso para as profundezas. Sua aparência também vai se modificando até atingir sua forma mais elementar. Torna-se água novamente, a origem de tudo, o elemento principal e fundamental da vida, o que nos sustenta, dá forças e energias.
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